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Transição capilar: mais do que estética, um ato de identidade e resistência

A transição capilar vai muito além da escolha de deixar os cabelos naturais crescerem. É um processo profundo de autoconhecimento, empoderamento e, para muitas pessoas, um reencontro com a própria identidade. Abandonar os alisamentos e químicas é, frequentemente, um ato político e simbólico, especialmente em uma sociedade onde os padrões de beleza ainda são fortemente euro centrados.

 

 

 O que é a transição capilar?

 

Transição capilar é o nome dado ao período em que uma pessoa decide parar de usar químicas para alisar o cabelo e permite que os fios naturais cresçam. Durante esse processo, convivem duas texturas diferentes no couro cabeludo: a parte alisada e a parte crescida natural.

Esse momento exige não apenas paciência, mas também força emocional, pois o visual muda gradualmente e, em muitos casos, há resistência externa – tanto da família quanto da sociedade em geral.

 

A importância identitária da transição

 

Para muitas mulheres negras e pessoas de cabelo crespo ou cacheado, assumir a textura natural dos fios é um passo de reconexão com a ancestralidade e a cultura. Durante décadas, o cabelo liso foi imposto como sinônimo de beleza, elegância e profissionalismo. Nesse contexto, deixar os fios naturais crescerem é romper com imposições e reafirmar a própria identidade.

A transição se torna, assim, uma forma de resistência. É dizer “não” a um sistema que marginaliza e invisibiliza as características afrodescendentes e, ao mesmo tempo, um “sim” ao amor-próprio e à valorização da diversidade.

 

O processo da transição

 

A transição capilar pode durar meses ou anos, dependendo da velocidade de crescimento do cabelo e das decisões da pessoa durante o caminho. Algumas etapas comuns são:

 

  • Corte químico ou Big Chop (BC): Muitas pessoas optam por cortar toda a parte com química de uma só vez. Outras preferem ir cortando aos poucos.
  • Convívio com duas texturas: Um dos momentos mais desafiadores, em que se busca alternativas para disfarçar a diferença entre as partes do cabelo.
  • Redescoberta da própria imagem: Ver-se com cabelo natural, muitas vezes pela primeira vez desde a infância, pode gerar inseguranças, mas também é libertador.

 

Cuidados durante e após a transição

 

Cuidar do cabelo em transição requer atenção redobrada. Aqui vão algumas dicas essenciais:

 

1.     Hidratação constante: Os fios precisam de muita água, principalmente a parte com química, que tende a ser mais ressecada.

2.     Cronograma capilar: Alternar hidratação, nutrição e reconstrução ajuda a manter o cabelo forte e saudável.

3.     Evitar fontes de calor: Secadores e chapinhas podem danificar ainda mais os fios e atrapalhar o processo de aceitação da textura natural.

4.     Finalização com texturização: Técnicas como twist, bigudinho ou coquinhos ajudam a uniformizar a textura.

5.     Uso de produtos específicos: Cremes, shampoos e óleos voltados para cabelos cacheados e crespos fazem toda a diferença.

 

Autoestima e representatividade

 

Um dos maiores ganhos da transição capilar é a construção de uma autoestima real, baseada em quem a pessoa é de verdade. Quando se vê representatividade na mídia, nas escolas e nos espaços de poder, o impacto é imediato: meninas e mulheres começam a se reconhecer como bonitas, competentes e dignas exatamente como são.

 

Influência nas gerações futuras

 

A transição capilar também planta sementes. Ao se assumirem, mães e pais mostram para suas filhas e filhos que não há nada de errado com o cabelo crespo. A liberdade capilar se torna, assim, herança afetiva e símbolo de orgulho.

 

O cabelo é identidade, não prisão

 

A transição capilar não é uma moda passageira. É uma jornada pessoal e coletiva de libertação, que envolve estética, saúde, resistência e, sobretudo, identidade. É sobre ter a liberdade de escolha – seja para manter os fios naturais ou, no futuro, alisá-los por vontade própria e não por imposição.

Seja qual for o caminho escolhido, o importante é que ele seja trilhado com consciência, carinho e respeito com a própria história.

 

Elder Farias é cabeleireiro especialista em Megahair e Cabelos Cacheados com mais de 25 anos no mercado. Proprietário do Elder Farias Hair Salon em Massachusetts – Boston.

 

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